segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Só eu estarei lá

No fim

Quando tudo e todos estiverem na frente de meus olhos fechados

Quando a última batida ecoar aqui dentro

No fim

Serei eu e meus tolos pensamentos

Perdidos para todo sempre

Aninhados numa caixa que logo também sucumbirá

Só eu estarei lá

No fim

Quando todos os esforços não fizerem sentido

Quando a luz fugir daqui de dentro

Ou quando ela finalmente entrar

Só eu estarei lá

E assim, só, me vou

Assim como sempre foi

E como se tudo que fui sumisse num buraco negro

Só eu estarei lá

No fim

Desde o começo

Só eu estive


domingo, 10 de agosto de 2025

Fui capaz de perdoar o que me feriu, o que me dilacerou, o que me matou

Mas não fui capaz de perdoar a mim

Eu, dona do meu querer, não pude entender o tanto que me deixei ferir

De tudo quanto pude perceber, meu lugar não estava ao sol

Não fui primeira

Não fui luz 

Não fui solução 

Em tudo quanto me doei, eis o dom do ser qualquer

Postergada

Devolvida ao furor de ser só 

Meu pálido inverno fez-se eterno

Não fui eu

Não fui ímpar 

Não fui suficiente

Ao que me desdobro, sobram-me os talvez

Talvez dê

Talvez possa

Talvez queira

E no imbuir de minhas qualidades, minha queda doeu solitária 

Dei o muito que esperei 

Esperei o muito que não me cabia

E mais uma vez, sob meu corpo inerte, meu grito dissipou

O eco nunca se foi

Não me perdoei.

Estou cansada mas não sei descansar

Meu corpo casa alarma a todo instante

Meus rodeios em transe em fogo em parafuso

Tudo em mim clama alma

Alma leve paira paz fio solto sopro livre 

Respiro mas afogo

Quem diria ser vida ainda quando falta ar chão teto cola rumo

Retenho os encontros que desencontram os caminhos exatos

Nada me escolhe

Me acolho em rios que eu mesma derramo

Sem saber se faz falta meu pífio papel

Sem saber se é meu papel 

Eu ia dormir e acordar pro sonho

Mas dessa vez tudo apagou 

É só hoje, prometi pra mim.

Em troca de todo troco honesto

Em volta de cada traço de sorte 

Acima de todo gesto de esperança 

Há de haver um eu que me encontra e ri

Que cala o medo

Que acalma o caos

Que gerencia esse emaranhado

Entre tragos e pouca coisa

Por dentre as frestas e ao redor do que me corrompe

Hei de ser

Hei de estar

Hei de seguir

E assim sem muito, ou até um pouco demais

Com toda graça que um dia me coube

Visto meu papel

Armo meu espetáculo 

Enceno a vida

Como quem ainda prepara seu primeiro ato

Lento, confuso, dilacerante

Como quem não ousa dizer mais que meia dúzia de palavras, e no seguinte passo tropeça no errante dicionário mundano.

E o tempo me toma

O tempo me disseca

O tempo me joga de volta

E com o mar de vidas que me cerca

Com os braços erguidos ao futuro

Brindo o agora 

E o agora

E o agora...


Em algum lugar me encontras

Já não em terras mansas

Já não em mares frios

Encontra-me no abrir do sol

No inteiro dia que colores 

Encontra-me e então, sorrateiramente, toma-me

Toma-me no todo, início, meio e fim

Cerca-me em teus braços 

Cola teu peito no meu

Siga-me por todas estradas e rios ,

por todos os horizontes que alcançares

Sequestra-me para ti na liberdade de sermos um

Leva embora os medos

Traz pra mim teu soluçar

E quando me encontrar, pousa

Eterna e calmamente

No berço do meu lar.

Ainda em tempo,

Viva.

Ainda em vida,

Caos

Nada que possa me afetar o fará melhor que eu

Eis que todas minhas dores executam perfeitamente meu castigo

Corpo de pecados.

Alma de querer profundo.

Quer o que lhe negam,

Oferece totalidade.

Sangra

Renasce

Sucumbe.

Ainda em tempo,

Continuo.

 


E foi assim...

Em cada primavera a melancolia e o desespero faziam parte de mim. Eu, que sempre procurei milhares de formas para solucionar tudo que ainda não tinha ocorrido, me vi estática. Mais um se aproximava e eu ainda não tinha encaixado partes dos anteriores.

Mas dessa vez, me peguei pensando que é bom estar aqui, e tudo bem que o tempo esteja passando por mim. Eu dei um pequeno espaço de contentamento para o hoje e ele cresceu no que eu chamo de consciência do estar. Me dei conta de coisas que talvez ainda não tivessem cabido nesses todos anos.

Ainda não me agradam os riscos no espelho, muito menos a compulsão de pensamentos, mas entendo um pouco melhor que ser o que sou torna essa vida possível.

Os anos seguem e eu, aflita pela carcaça, clamo para que o tempo seja gentil para com essa passageira. E quando olho pra dentro, sei que pouco importa minha veste mundana. Sou o melhor que poderia caber nesses 36.

 Minh'alma é fúria.

Fruto doce do pecado.

 Em viés de desordem, esgueira-se nos cantos sombrios.

Sobe alto e de lá desaba como numa brincadeira de ser flexível. Nem sempre. 

Desata a rir-se, sabendo bem das peças que prega em si mesma.

E na sua grandeza, me acolhe pequena, um grão que esbraveja por ser visto.

Minh'alma sabe. Sabe bem demais. É grande, grande. Do tamanho que me sustenta.

E eu, pequena, sereno nela.

 Nada em mim é o normal

Nada além do corpo, que bombeia e espalha esse sangue que me cobre

Nada em mim encaixa como moldes e legos, perfeitos em suas funções 

Nada parece belo e colorido como às vezes achei que deveria

Nada funciona como eu vejo no alheio

Ainda nada me deixa tão perplexa no espelho quanto tentar achar nos olhos, esses abrigos de alma, as partes que me completam 

Nada em mim é acertado antes 

É sempre gana, tropeço e aflição 

Nada em mim é feito de 'espero e aceito'

Eu tenho ânsia, eu tenho pressa, eu tenho veias contraditórias e desconfiadas

Nada em mim vai te dizer o quanto estou verdadeiramente nessa pele enquanto me olhas 

Nem sempre estarei

Nada em mim vai ser um sim alegre e destemido o tempo todo

Nada vai parecer igual todo dia

Nada que eu ainda desconheça me assusta, porque eu escancaro minhas entranhas quando sinto que posso mais (ou menos)

Nada em mim dirá que sim quando você achar que não 

Nada em mim vai desafiar os achismos que não os meus

Nada em mim será tão entregue quanto o sentir

E essa parte assusta

Mas nada, absolutamente nada, será em vão, raso, mesquinho

Nada em mim foge do que é.